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03 Abril 2024

“É necessário um trabalho de equipa mais completo e consistente que permita dar uma resposta multidisciplinar aos pacientes”





 O médico dentista e Professor Doutor Sérgio André Quaresma exerce a sua prática clínica em Lisboa, centrada na área da endodontia. O recém empossado presidente da SPE é também Assistente Convidado da Pós-graduação em Endodontia da Faculdade de Medicina Dentária da Universidade de Lisboa. O médico dentista e Professor Doutor Sérgio André Quaresma exerce a sua prática clínica em Lisboa, centrada na área da endodontia. O recém empossado presidente da SPE é também Assistente Convidado da Pós-graduação em Endodontia da Faculdade de Medicina Dentária da Universidade de Lisboa.

“A associação simplista da endodontia à dor traduz-se em algumas lacunas ou numa dificuldade acrescida em identificar as mais valias desta especialidade no contexto geral da Medicina Dentária”. Quem o afirma é o recém empossado presidente da Sociedade Portuguesa de Endodontologia (SPE), Sérgio André Quaresma, para quem a relevância do tratamento endodôntico “deve ser valorizada por todos os pares, uma vez que assume um papel preponderante” na garantia e manutenção da saúde oral dos pacientes como um todo. Em entrevista à Maxillaris, o médico dentista – e Assistente Convidado da Pós-graduação em Endodontia da Faculdade de Medicina Dentária da Universidade de Lisboa – analisa a presente conjuntura desta especialidade. E antecipa as prioridades de atuação da nova equipa diretiva da SPE.

Na sua opinião, que papel assume hoje a endodontia no contexto global da Medicina Dentária?
A endodontia cuida da prevenção, diagnóstico e tratamento de patologias que possam afetar a polpa dentária, assim como os tecidos periodontais adjacentes. Os seus objetivos cruzam-se assim com os da Medicina Dentária como um todo, atuando na preservação de todas as peças dentárias. A endodontia tem vindo igualmente a melhorar as suas taxas de sucesso e sobrevivência devido à introdução de novas técnicas e de equipamento mais moderno, o que permite um tratamento mais previsível e duradouro. O tratamento endodôntico é um tratamento complexo e que se revela fundamental para a manutenção e recuperação de dentes com cárie, desgaste ou fraturas, e a sua relevância no tratamento dos pacientes deve ser valorizada por todos os pares, uma vez que assume um papel preponderante na garantia e manutenção da saúde oral dos pacientes como um todo.

Como comenta o panorama da formação desta disciplina em Portugal? Acha que é preciso reforçar a aposta neste campo?
Julgo que, de um modo geral, o ensino em Portugal já é bastante completo. A meu ver, o que falta é uma aposta na modernização do ensino. Ou seja, deveria existir mais prática de pré-clínico com recurso a materiais mais modernos. É de enaltecer a existência de um corpo docente cada vez mais diferenciado o que possibilita um ensino teórico e prático muito atual e consistente com os padrões do ensino a nível mundial na endodontia.

Que outras lacunas identifica no exercício da endodontia à escala nacional, eventualmente também universal?
Pensando à escala universal ou, pelo menos de uma forma mais abrangente, julgo que a associação simplista da especialidade à dor traduz-se de facto em algumas lacunas ou numa dificuldade acrescida em identificar as mais valias da endodontia no contexto geral da Medicina Dentária. A Associação Americana de Endodontia, numa publicação de 2017, refere precisamente que o tratamento endodôntico é visto de forma negativa por grande parte da população devido à sua associação com a dor, reforçando que é importante conhecer as causas da dor, e como pode a mesma ser evitada, para que os pacientes não tenham experiências desagradáveis e não temam o tratamento endodôntico. Esta noção de que os tratamentos, bem como o pós-operatório, não têm de obrigatoriamente ter dor associada, altera desde logo a relação dos pacientes com esta especialidade, levando inclusivamente a que percebam os benefícios de optar por um tratamento endondôntico em vez de uma extração, por exemplo.
A nível nacional, em termos de prática clínica, julgo que falta sobretudo um planeamento dos casos e uma correta e atempada avaliação do grau de dificuldade, a par de uma falta de condições de materiais, assegurados pelas clínicas, que permitam a realização de um tratamento de qualidade. Por último, mas não menos importante, falta também uma maior sinergia, um consistente trabalho de equipa do corpo clínico, entre pares, em prole da saúde dos pacientes.

Que pautas/linhas considera imprescindíveis quando se exerce um tratamento do foro endodôntico?
Acredito que para o sucesso de um tratamento o profissional deve ter em conta alguns aspetos, tais como: analisar a complexidade anatómica, ter em consideração o grau de conservação de estrutura que cada técnica oferece, a posição do dente na arcada, o grau de abertura da cavidade oral e a finalidade restauradora. O profissional deve ter a clara consciência de que cada caso é um caso único e, como tal, necessita de uma avaliação criteriosa de forma a ser selecionada a melhor técnica.

Que importância atribui ao conceito de interdisciplinaridade em endodontia? Neste particular, que áreas complementares ou especialidades são prioritárias nesta interação?
A cooperação e colaboração das diversas áreas revela-se de extrema importância para que o sucesso dos tratamentos seja alcançado. A relação interdisciplinar e partilhada entre as várias especialidades permite uma abordagem muito mais complexa dos casos. A decisão entre a extração de uma peça dentária ou a sua manutenção deve ser assumida tendo em conta uma abordagem mais completa dos casos, para além do risco, da predictibilidade e do custo-benefício. É imprescindível estabelecer um plano de tratamento que não defraude as expectativas do paciente mas que tenha, ao mesmo tempo, consideração pelos limites do caso em particular. Assim, a tomada de decisão pelo rumo de um tratamento a aplicar nunca pode (ou não deveria) ser singular. Não se trata de uma rivalidade entre a endondotia e as outras áreas mas sim de uma simbiose entre esta com a periodontologia, a ortodontia, a implantologia, a prostodontia e medicina dentária preventiva. É esta interdisciplinaridade que permite uma avaliação realista dos riscos, resultando numa melhor tomada de decisão.

Qual é a sua “fórmula” para atingir os melhores resultados no que diz respeito à relação médico dentista-paciente? Acredito que a forma como tratamos os pacientes e a relação de confiança que criamos com eles são aliados de peso para o sucesso dos tratamentos. Desde logo, gosto de cultivar nas minhas relações médico dentista-paciente a seriedade e o respeito pela dor do doente, a capacidade (e a vontade) de ouvir, apresentando possíveis soluções e gerindo as expectativas do doente. Ser disponível, esclarecer dúvidas e tranquilizar são aspetos que não podem ser descurados. Numa perspetiva de prática clínica é imprescindível confiar na equipa, ser consciente das próprias capacidades e das condições da clínica. É igualmente importante o planeamento e a organização das etapas operatórias das consultas, a par da obediência aos princípios biológicos e mecanismos da preparação do canal radicular, bem como ao cumprimento e utilização de técnicas e materiais biocompatíveis e de uma restauração adequada.

Que opinião tem sobre o papel (e a evolução) das novas tecnologias como suporte à prática endodôntica?
Temos assistido nos últimos anos a uma evolução significativa da endodontia com o aumento de pesquisas e com o desenvolvimento de novas tecnologias que permitem revolucionar os métodos e técnicas tanto para tratar o canal radicular, quanto para a sua visualização e diagnóstico por imagem. Temos como alguns exemplos as limas de liga de níquel-titânio (NiTi) e suas variáveis, altamente flexíveis, os diferentes sistemas motorizados de instrumentação de canais radiculares, os localizadores apicais eletrónicos, a tomografia computadorizada de feixe cónico, cimentos biocerâmicos, o uso do microscópio e a irrigação ultrassónica. Estas novas tecnologias, e a consequente evolução das técnicas, desempenham um papel crucial como suporte à prática endodôntica uma vez que possibilitam uma resposta clínica mais capacitada e adequada.

Em que momento se encontra a endodontia sob o ponto de vista científico e terapêutico?
Neste momento a endodontia encontra-se a passar por um acentuado periodo de pesquisa tanto a nível internacional como nacional. Temos cada vez mais doutorados na endodontia e temos clínicos portugueses com cada vez mais publicações em revistas conceituadas na área da endodontia. Estes profissionais são sinónimo de produção científica tendo em vista melhores tratamentos e melhores taxas de sucesso.

Que inovações/avanços antevê, a curto ou médio prazo, em contexto endodôntico?
Temos assistido de uma maneira geral, na sociedade, à evolução da tecnologia nas mais variadas áreas. A inovação tecnológica tem permitido a execução de tarefas diárias com maior agilidade e rapidez, de uma forma mais confortável e segura. A Medicina Dentária no geral, e a endodontia em particular, têm acompanhado esta evolução espelhando vários avanços tecnológicos na prática clínica com a introdução de aparelhos mais modernos e de novos materiais. Estas inovações reduziram drasticamente o tempo operatório do tratamento, o que se traduz em maior conforto para o paciente. As tomografias computadorizadas, o escaneamento intraoral, o planeamento cirúrgico em software e o advento da impressão digital (3D), resultou que tratamentos endodônticos em casos de calcificações severas sejam bem-sucedidos. No futuro acredito que teremos acesso a guias de trabalho mais precisas e ajustadas a cada caso e a preços mais acessíveis. Outra das melhorias será a contínua possibilidade de alteração das ligas das limas tornando-as ainda mais resistentes à fratura, bem como tornar ainda melhores e mais os softwares de aquisição de imagem na área da tomografía.

Tomou posse, recentemente, do cargo de presidente da Sociedade Portuguesa de Endodontologia. Que prioridades definiu a nova direção para o mandato que agora se inicia?
A Sociedade Portuguesa de Endodontologia aposta em algumas ambições que gostaria de ver cumpridas nos próximos tempos, ou pelo menos, que começasse a ser traçado um caminho para que estas se concretizem. Estas prioridades passam, desde logo, pela literacia para a endodontia na sociedade em geral - é importante que as pessoas percebam que estes tratamentos permitem salvar dentes naturais preservando-os do ponto de vista estético e funcional, que de outra forma teriam de ser extraídos.
Outra das ambições, e talvez ainda prévia à perceção da sociedade em geral, passa pela valorização da endodontia entre colegas dentro da própria clínica. É necessário um trabalho de equipa mais completo e consistente que permita dar uma resposta multidisciplinar aos pacientes.
A SPE pretende igualmente modernizar a sua comunicação interna e externa tornando-a mais fluída e direcionada, promovendo uma aproximação da sociedade científica aos seus associados bem como um estreitar de laços junto das sociedades parceiras, possibilitando um intercâmbio científico e cultural.

Que pormenores já podem ser revelados sobre o IV congresso da SPE, que vai ter lugar em setembro?
Tal como vem sendo habitual pretendemos com o nosso congresso levar a todos os colegas (associados e não associados) o que de melhor se faz a nível nacional e internacional na área da endodontia. O tema do IV congresso é “Do retratamento endodôntico não-cirúrgico à microcirurgia apical”. o congresso irá decorrer nos dias 27 e 28 de setembro próximo, na cidade de Guimarães, no Centro Cultural Vila Flor. Quanto ao programa científico, apenas posso adiantar que iremos iniciar, na manhã do dia 27, com o Fórum Ibérico, em que estarão presentes universidades portuguesas de Medicina Dentária e algumas universidades espanholas, para que possam apresentar trabalhos e linhas de investigação na área da endodontia, promovendo assim a troca de experiências. Nessa mesma manhã de 27 teremos também a decorrer três workshops com três palestrantes internacionais de renome. O congresso terá início na tarde de dia 27, mas para que possam saber mais convido todos os colegas a seguirem a Sociedade Portuguesa de Endodontologia nas redes sociais bem como a nossa página do congresso (www.congressoendo.pt).

Que outras iniciativas merecem particular destaque na agenda da SPE para este ano? Este ano temos como objetivo muito claro continuar a apostar nas EndoAperitif, que têm sido palestras, por todo o país, dadas por distintos colegas da área de endodontia e nas quais continuamos a assumir um papel de divulgação de conteúdos formativos junto de todos os interessados. Outra das iniciativas passa por organizar palestras em conjunto com sociedades parceiras nacionais e internacionais, permitindo enriquecer e valorizar o nosso conhecimento, através da troca de experiências.

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